domingo, 27 de março de 2011

Bananinhas

Em respeito a minha formação religiosa continuo a confessar-me...eu não amo as bananinhas de Paraibúna. Não as de Paraibuna em particular, mas as bananas passas em geral. Nunca as compro, porém, nas paradas de beira de estrada, tenho uma ataque epifânico e acho que não posso viver sem elas. Mesmo que não as compre, pego os pacotinhos e disparo com ares de conasseur afetada:

_Hum! Essas bananinhas são ótimas. E isso é tão verdadeiro que até eu me convenço ...

Voltávamos de uma viagem penosa...falidos, cansados e fedidos. Eu e meus dois amigos.

Eu dividia o banco traseiro de uma charanga de locação, com papeladas socadas em horríveis sacos pretos, malas e cabides que tentavam em vão, proteger a lisura das camisas que um dia foram alisadas a ferro quente.

O Capeta havia decido não apenas comandar o trânsito, como bafejar sobre asfalto, derretendo quase tudo... É certo que nosso otimismo perante a vida estava bem amolecido, amorfo...

Guardando a tradição que acomete os viajantes de alma atribulada, na entrada da marginal de São Paulo, sob as pontes e acima do rio injustiçado, prostavam-se todos os pensamentos relativos a contas atrasadas e balancetes da forma de se tocar a vida.

Mas a exemplo das bananinhas de Paraibuna que guardaram sua textura e dulçor mesmo sob condições adversas, nosso humor politicamente incorreto, arrancou-nos gargalhadas de todos os tipos: das feiúras do corpo e da alma, involuntárias ou opcionais, de desconhecidos ou familiares e principalmente de nós mesmos.

Nós e as bananinhas, enganamos a Esfinge, protetora dos oráculos. e novamentre somos metropolitamos. Afinal, decifrar ou ser devorado, neste caso, era quase a mesma coisa.

terça-feira, 22 de março de 2011

Pão

Devo confessar: minha relação com o pão vai muito além da manutenção das forças cotidianas. Sagrado sim, mas da mesma forma como sacralizo todos os meus outros prazeres. Amo pão. Pão se banca: não se intimida diante de louças sofisticadas: pede mãos, ignora prataria dos talheres, impõe tato. Partido em pedacinhos ou nacos, dos dedos à boca, resgatando por vezes, o molho que clama no prato!

Mas não se engane, pães não são tão inocentes assim. Tem lá seus truques para disfarçar o resultado do emprego de matéria-prima ordinária e relacionamentos ruins, como: falta de habilidade, negligência e até maldade de quem preparou a massa. A fada madrinha dos pãezinhos ruins é a temperatura. Mágica efêmera. O pãozinho ruim tem apenas dez minutos para ser comido com status de gostosíssimo. A sedução começa pelo olfato. Dificilmente alguém é indiferente ao perfume de pão quentinho. Quesito democrático: pães bons e ruins, quando quentes tem o mesmo aroma. A regra de dupla textura: casca crocante e miolo de exata maciez, quase passa despercebida. Vapor quente que derrete lascivamente a manteiga. Bem, quando tudo se esfria, fica claro quem é quem. Quase como gente.

Tudo isso passava pela minha cabeça, enquanto comprava os pãezinhos na padaria perto de casa. Infelizmente seus os francesinhos só me despertam êxtase ,sob a benção da temperatura ou quando estou doida de fome.

Dois caixas, uma pequena fila, cinco pessoas. Na minha frente uma senhor com um saco enorme de pãezinhos, provavelmente pintor, já que tinha as mãos e roupas chuviscadas de tinta. Quando ele se dirige ao caixa, é atropelado pela empáfia metamorfoseada de ser humano, que ignorando a lei da física (aquela que diz que dois corpos não podem ocupar o mesmo lugar no espaço), desconsidera os pães do pintor já colocados no balcão. O pintor balbucia uma menção à fila e a empáfia vestida de terno encontra deixa para seu discurso pronto sobre os direitos da terceira idade, proclamado com escárnio e ira desmedida. Ao bem da verdade e não da legalidade, aquilo sequer era uma fila.

O Senhor Empáfia deve tentar todos os dias disfarçar seu mau comportamento sob a legislação. O truque não funciona. Grosseria e falta de educação deixam até os direitos com gosto de ranço.

Os pãezinhos sentiram vergonha alheia e esfriaram-se imediatamente. Eu perdi o apetite e rumei para outras fermentações: abri uma cerveja sem brindes.