terça-feira, 23 de agosto de 2011

Papéis

Era preciso escrever um bilhete. Mas, fosse o que fosse escrito, não seria suportado por qualquer papel. A assepsia alvejada do sulfite, o cenário dos papéis de carta ou pautas definidas, não contemplariam mensagem tão angular.

Buscou papéis do passado e soube o que queria: papel de pão. O adeus escrito no papel de pão imortalizado em músicas, poesias e fofocas da vizinhança: “Escreveu Adeus no papel de pão e se foi para sempre”. Tentou lembrar-se desse e de outros papéis distantes.

O tal, do pão, às vezes fino e encerado, era disputado pela criançada muito mais para desenhos, do que para cartas de despedida, felizmente.

Em rosa inconfundível vinha a carne embrulhadinha dos açougues.

Outro rosa era do papel higiênico, que devido a sua falta de gentileza, preferiu não aprofundar as lembranças,

As bananas embrulhadas em jornal, as argentinas maçãs em ninhos de papel roxo, balas duras de mel e hortelã embaladas em papéis permeáveis.

E agora, qual papel escolher para o bilhete da sua vida? A dramaticidade do adeus e do papel de pão, o roxo perfumado de tango e juras de amor, ou folhas de bananeiras marcadas a ferro com as quenturas da carne?

Assustada com a dureza de seus veredictos e sem fôlego para as certezas, decidiu por hora escrever no vento e distrair-se com as notícias vencidas do jornal das bananas.

2 comentários:

Anônimo disse...

Querida Lili! Saudades de voce.
Que delicia ler suas escritas.
Por favor, continua escreendo!
Beijos...Joelma

Lili disse...

Joelma,
Saudades! Que bom que você tem lido, beijos